O Grande Curioso
Apaixonado pelo século 19, Paulo
Goulart pesquisa de tudo na história paulistana: da rede de águas pluviais à
febre de colecionar figurinhas
por ANDRÉ LOBATO
Há 25 anos, Paulo Goulart, 57, lê, sem café nem
lupa, jornais do século 19. "É meu passaporte para a fantasia",
sorri. O hábito chega a ser diário dependendo da pesquisa que ele resolve
fazer, que pode ser sobre temas tão variados quanto a trajetória da criação dos
"jingles" e a rede de águas pluviais da cidade.
A predileção por esse século -no qual o Brasil entrou colônia e saiu potência
regional- surgiu quando ele pesquisava o uso de recursos gráficos em jornais
para a Secretaria Municipal de Cultura, onde trabalhava.
O levantamento burocrático se transformou em paixão e ganhou forma com o livro
"Noticiário Geral da Photographia Paulistana" (Imesp-CCSP, R$ 75, 340
págs.), sobre a história da fotografia na cidade de 1839 a 1900. A obra lhe
rendeu o troféu do 50º Prêmio Jabuti de Arquitetura, Urbanismo, Fotografia,
Comunicações e Artes. Hoje, fica na sala de casa, em Vargem Grande Paulista (44
km ao sul de SP), com outros cacarecos antigos.
Paulo gosta de ser definido como um grande curioso. "Meu foco é uma
viseira de 360º." A pesquisa inicial rendeu ideias para cerca de 40 projetos
historiográficos. "Depois que ele ganhou o Jabuti, decidimos que esse
material não pode ficar atrás das prateleiras", afirma Marisa de Paula
Souza, 59, sua mulher.
Os documentos estão organizados em grandes estantes. "Aqui não tem nada da
semana passada", conta ela. Além dos jornais, outras fontes de informação
para seus projetos são livros, fotografias, documentos, partituras musicais e
discos.
Algumas pesquisas são vendidas como brindes corporativos pela editora do casal,
a A9. Outras viram livros como "Música e Propaganda" (A9, R$ 65, 120
págs.), lançado em agosto, que retrata a gestação dos "jingles"
publicitários no país. Lojas encomendavam melodias e as distribuíam com o nome
de suas marcas.
Se o surgimento da propaganda foi melódico, a construção do viaduto do Chá
representou debate público ruidoso. Não fosse a ousadia do francês Jules
Martin, conta o pesquisador, dificilmente o projeto sairia do papel. A história
desse "super-empreendedor" da época também está na gaveta de futuros
projetos.
Em breve, Paulo pretende lançar mais dois livros, um sobre a febre de
colecionar figurinhas -que, no início, vinham com imagens de navios, mulheres
com pouca roupa e figuras ilustres- e outro sobre o nascimento do brinde
comercial.
Pai de dois filhos e leitor de um tipo de jornal com poucas fotos e muitas
letras miúdas, Paulo diz que a curiosidade se revela na minúcia. "Às
vezes, é na última palavra que está o que interessa."
fonte: Revista São Paulo edição nº 88